Programa de militarização escolar exclui estudantes mais pobres visando aumentar índices de desempenho
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Uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP revelou que o Programa de Colégios Cívico-Militares do Paraná (CCMPR) vem contribuindo para a exclusão de estudantes em situação de maior vulnerabilidade social. O estudo, realizado pela geógrafa Rafaela Miyake, mostra que o modelo foi estruturado de forma a aumentar artificialmente os números do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), criando um cenário de “elitização” na rede de ensino.
Segundo a pesquisadora, não existem evidências científicas que comprovem que a militarização seja responsável pela melhoria dos índices educacionais. Pelo contrário, o estudo intitulado Geografia da expansão da militarização nas escolas da rede pública a partir do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares aponta que a exclusão de estudantes trabalhadores e de turmas noturnas foi decisiva para elevar as médias.
Entre 2018 e 2023, o número de vagas para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) nas escolas que aderiram ao programa caiu de 8.077 para apenas 731. Já no ensino regular, as vagas no período noturno passaram de 24,8 mil para 2,9 mil, enquanto 14 mil novas vagas foram abertas no período diurno. “Quando você fecha o noturno e o EJA, você aumenta o Ideb. Porque são esses alunos que trabalham, reprovam, não vão para a escola etc. Então, realmente, quando você fecha isso, você sobe o Ideb”, explicou Miyake.
O CCMPR foi implantado pelo governo do Paraná, chefiado por Carlos Roberto Massa Júnior, com base no Decreto Federal nº 10.004, que instituiu em 2019 o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim). A proposta previa o emprego de policiais militares e bombeiros na gestão educacional e administrativa das escolas.
Apesar de a política nacional ter sido revogada em 2023, o estudo aponta que estados e municípios que já tinham aderido ao modelo incorporaram o programa em iniciativas próprias, como ocorreu no Paraná. Até 2024, o estado já havia militarizado 312 escolas.
Para a pesquisadora, além de ferir princípios constitucionais, o modelo reforça desigualdades, criando “ilhas de excelência” que maquiam os problemas estruturais da educação pública. “Essas escolas operam dentro de um campo de exceção, com mais recursos, melhores condições estruturais e estudantes de perfil socioeconômico mais alto. Isso aumenta as notas, mas exclui justamente quem mais precisa da escola pública”, destacou.
Miyake ainda critica o uso isolado do Ideb como parâmetro de qualidade: “Quando eu pego um dado isoladamente e uso ele para medir qualidade em um território tão desigual quanto o nosso, estou apenas mascarando as desigualdades”, concluiu.
📌 Fonte: Jornal da USP – Texto de Rafael Dourador, edição de Isabela Nahas.
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