O tesouro do instante – Por Paula Hammel

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Abandonar previsões exige desprendimento diante do desconhecido.

Episódios efêmeros surgem apenas para aqueles capazes de captar sutilezas que delineiam trajetórias da vivência.
Plenitude autêntica, quando acessível, brota do olhar que se demora…
da apreensão que reconhece intensidade e significado nas menores manifestações do universo circundante.

Inteireza não se revela em grandiosidades, mas nos aspectos que a rotina oculta:
aroma do café ao despontar da manhã,
luminosidade atravessando móveis silenciosos,
fragrância antiga de volumes esquecidos,
gargalhada infiltrando-se nas frestas do dia,
toque confirmando união entre indivíduos.

Cada oportunidade delicada convoca a acolher aquilo que integra jornada,
valorizar conquistas
e descobrir harmonias invisíveis em cada acontecimento.

Existir com discernimento requer sensibilidade refinada
e coragem serena.
Diferenciar júbilo profundo da efemeridade disfarçada de importância
transforma percepção em sabedoria, experiência em compreensão genuína.

Captar nuances, absorver impressões, extrair encantamento onde pressa não alcança…
significa decifrar rota da consciência em toda magnitude.

O cotidiano oferece lampejos breves, porém intensos.
Somos convidados a recebê-los, integrá-los
e conferir-lhes significado por meio de ações minuciosas.

Sorrir sem expectativa…
observar sem julgamento…
tocar sem posse…
Alinhar-se com tempo vivido revela arte de existir.

Todo suspiro encerra eternidade própria;
cada ocorrência concentra cosmos singular;
toda pausa contém potencial de transfiguração.

Realização plena não consiste em alcançar metas ou horizontes distantes.
Sublimar atividades simples em vivências memoráveis,
agradecer mesmo quando rotina parece trivial,
revelar beleza oculta —
eis essência da completude.

Habitar mundo não se esconde em promessas futuras,
mas em episódios singulares:
palavras ecoando sem pressa,
olhares confirmando reciprocidade,
gestos permanecendo como refúgio silencioso.

Quando expectativas tornam-se obstáculos,
quantas vezes buscamos prazer fora do alcance do agora,
em horizontes inexistentes?

Desafio reside em perceber que cada ato mínimo,
cada pormenor despercebido,
cada interação discreta encerra plenitude latente.

Retalhos cotidianos —
sombra dançando com brisa vespertina,
tilintar inesperado de utensílios,
sopro roçando pele,
ou rumor distante de folha desprendida —
constituem portais para deleite genuíno.

Reconhecer tais instantes demanda apreensão prolongada.
E acaso não reside aí mistério do existir?

Enigma encontra-se na compreensão lúcida do que circunda,
na capacidade de extrair do tempo preciosidades sutis,
harmonias escondidas e poesia inédita.

Descobrir profundidade em fragmentos do dia
é decifrar significados velados entre objetos e pessoas,
entre gestos breves e pausas delicadas.

Gratidão constrói ponte entre desejo e vivência,
entre passado e eternidade.

Ao perceber que todo sopro, movimento delicado e lapso contém universo próprio,
constatamos que existir plenamente configura ato de coragem, contemplação e beleza.

Render-se ao tempo vivido é atravessar trivial
e tocar infinito.

Cada segundo encerra vastidão de instantes;
cada ação, mesmo mínima, contém magnitude do todo.

Nesse encontro com essência do ser, revela-se dádiva suprema:
contentamento não é destino,
mas consciência intensa, sutil e imortal.

Respiramos, sentimos, maravilhamo-nos com simples
e descobrimos que vida, em sua plenitude, não espera;
oferece-se sem aviso em cada episódio que ousamos habitar.

Raios de sol infiltrando frestas,
vento brincando com cortinas,
curva de manifestação inesperada…
todos indicam mesma verdade:

Felicidade consiste em perceber extraordinário no ordinário,
como orvalho capturando reflexo inteiro do céu em gota cintilante;
como sorriso de criança transformando manhã inteira em promessa de eternidade.

Paula Hammel

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Editor Ourinhos Online