Nas conchas do afeto: a essência dos nativos da Lua- Por Paula Hammel

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Há uma presença que não se compreende; apenas se pressente, nos nativos do signo da Lua. Não chegam com alarde nem impõem sua vontade com urgência. Aproximam-se em silêncio, como aqueles cujos gestos são os quais anunciam um zelo delicado. Relacionam-se com o tempo como quem o reverencia, numa lentidão interior que muitos confundem com paralisia, mas na qual repousa uma atenção rara.

Transportam o passado como se ainda o habitassem. Para eles, não se trata de um espaço onde se esteve, mas de uma substância viva, feita de lembranças minuciosas e de dores ainda úmidas, nas quais a recordação se ancora e a identidade se forma. O que foi, permanece.

Nada em sua essência é casual. Tudo brota de origens precisas, de causas silenciosas, de rastros invisíveis pelos quais circulam com reverência instintiva. Percebem como quem busca sentido. Constroem como quem borda silêncio sobre a pele. Entregam-se à estabilidade, mesmo quando essa exige renúncia. Repudiam a leveza do efêmero não por obstinação, mas por princípio: aquilo em que não firmam raízes não é capaz, para eles, de sustentar qualquer verdade.

Amar, nesse território, não se declara; constrói-se. E essa edificação não ocorre por gestos ruidosos, mas nos interstícios do cotidiano: pausas, escutas; delicadezas quase imperceptíveis, pelas quais o vínculo se insinua e se afirma. Não se expõem com facilidade. Revelam-se apenas quando percebem que o outro saberá acolher aquilo no qual a linguagem não alcança. E revelar-se, para eles, é abrir um templo interior.

A saudade não os paralisa. Ancora. Não é enfermidade, mas disciplina emocional. Retornam ao passado por fidelidade às experiências nas quais aprenderam a perceber o mundo com profundidade. São leais ao que viveram, mesmo quando a existência já lhes oferece outras versões. Não partem por completo. Permanecem ligados aos fios pelos quais suas histórias ainda respiram.

Quando magoam, não o fazem por impulso, mas porque foram atravessados exatamente no lugar cuja esperança habitava, zona íntima na qual jamais imaginaram ser vulneráveis. Ferem como quem sangra, não como quem deseja causar dor. E, ao se retirarem, não deixam vestígios tumultuados, mas marcas discretas, as quais falam mais do que qualquer explicação.

Amar alguém de Câncer exige maturidade, daquelas nas quais a certeza cede lugar à escuta. Requer presença sem invasão, silêncio sem frieza, reciprocidade sem espetáculo. É preciso chegar inteiro e, ainda assim, estar disposto a mergulhar em regiões nas quais o verbo é insuficiente, onde o sentir antecede o nomear. Porque é lá, nesse espaço sem nome, vilarejo onde a linguagem se curva, que habita o afeto mais profundo.

São feitos de água, sim, mas daquela que permanece. Escavam lentamente o íntimo de quem escolhem, criando frestas pelas quais penetram sem alarde. Ali permanecem, como quem transforma a entrega em abrigo. Nada neles é superficial. Nada é fugaz. E talvez por isso tantos se afastam: não sabem respirar nas profundezas às quais esse signo conduz.

Mas quem fica, conhece o refúgio. Amar um canceriano é ser acolhido num tempo sem pressa, numa memória que preserva mesmo na ausência, num cuidado cujo mundo continua a valer a pena, mesmo quando tudo ao redor parece ruir. É a contradição do amor que tenta eternizar o transitório, a tentativa humana de conter o calendário malicioso numa concha onde ainda se escuta o mar

Paula Hammel

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Editor Ourinhos Online