Os Problemas Atuais da Educação no Brasil: De Quem É a Culpa? – Por Maurício Saliba
Nesse artigo, daremos continuidade na discussão sobre a qualidade da escola. Vamos começar desarmando uma teoria conspiratória que insiste em sobreviver à base de WhatsApp e mesas de bar: “Paulo Freire acabou com a educação”. Essa frase está para o debate educacional como o terraplanismo está para a geografia — uma demonstração épica de ignorância com um toque de entretenimento involuntário. Para quem repete isso com a convicção de um profeta iluminado, uma notícia: a pedagogia de Freire foi pensada para alfabetizar adultos marginalizados, não para definir a grade curricular de escolas básicas. Culpar Freire pela decadência do sistema educacional brasileiro é como responsabilizar Newton por quedas de avião.
Mas então, de onde vem o problema? Voltemos aos anos 1960: a escola pública deixou de ser privilégio para poucos e tornou-se universal. Um grande avanço, certo? Por uns cinco minutos, talvez. A democratização do acesso trouxe consigo desafios monumentais que permanecem até hoje — e pioram. A expansão foi desordenada, sem investimentos adequados em infraestrutura, formação de professores ou material pedagógico. O mantra passou a ser “quantidade de matrículas”, como se encher salas resolvesse alguma coisa.
Naquele passado glorioso que tantos romantizam, havia poucos alunos nas escolas públicas, escolhidos a dedo. Os professores eram bem remunerados, respeitados e tinham a “nobre” missão de ensinar a elite. Agora que a escola é para todos, o caos parece inevitável — mas não porque se democratizou o acesso. O problema real é o abandono estatal e a crença tosca de que quantidade compensa a falta de qualidade.
Do lado dos alunos, a situação beira o trágico. Como esperar concentração e desempenho de jovens que vivem em lares instáveis, quentes, barulhentos e sem condições mínimas de estudo? A imagem bonitinha do “cantinho do estudo” cai por terra quando a realidade inclui casas superlotadas e famílias que, por razões históricas, não têm o capital cultural necessário para apoiar seus filhos. Quem acha que disciplina e força de vontade bastam deveria tentar ler Machado de Assis com fome ou após um turno exaustivo de trabalho infantil.
E os professores? Ah, esses “heróis” que a sociedade adora romantizar em discursos, mas jamais valorizar de verdade. Desgastados, correndo de escola em escola como maratonistas compulsivos, acumulando aulas apenas para sobreviver. Planejamento pedagógico? Sonho distante. Imagine pedir a um cirurgião para operar sem bisturi, mas exigir uma cirurgia perfeita — eis o cotidiano dos educadores brasileiros.
Enquanto isso, os países com sistemas educacionais exemplares seguem uma receita óbvia: professores bem remunerados, dedicados a uma única escola, com tempo e estrutura para conhecer seus alunos e desenvolver projetos. Após as aulas, eles não saem correndo para o próximo “bico”, mas ficam disponíveis para orientação e atividades complementares. No Brasil, isso soa como ficção científica.
No fim das contas, o problema da educação não se resolve apenas com “mais disciplina” (como o exemplo ridículo das escolas cívico-militares) ou “melhores professores”. Enquanto nossos alunos forem pobres, viverem em lares desestruturados pela miséria e lidarem com a incerteza sobre o próximo prato de comida, não haverá concentração suficiente para estudar, muito menos para absorver conteúdos complexos. Por outro lado, sem professores que possam viver dignamente ministrando aulas em apenas uma escola, que não precisem assumir mais aulas do que possam dar conta para poderem sobreviver, continuaremos a andar em círculos.
Exigir uma educação de qualidade sem resolver essas questões estruturais é como querer plantar rosas em solo árido — ou, para ser mais direto, é só mais uma maneira de culpar os mesmos de sempre.
Share this content: