Governo Tarcísio testa uso de inteligência artificial para vigiar crianças em escolas públicas
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O governo de São Paulo, sob comando de Tarcísio de Freitas (Republicanos), está implantando de forma experimental um sistema de vigilância por inteligência artificial (IA) em 11 escolas estaduais. A tecnologia, chamada SADI (Sistema de Autoavaliação de Desenvolvimento Inteligente), promete avaliar o “engajamento” dos alunos em sala de aula, mas na prática funciona como um monitoramento constante de crianças e professores.
Segundo informações do Diário do Centro do Mundo (DCM), câmeras instaladas em salas captam movimentos, expressões faciais, interações e até o uso de celular dos estudantes, enquanto algoritmos classificam cada comportamento em métricas que nem os docentes compreendem totalmente.
O projeto é desenvolvido desde 2024 pelo Instituto de Tecnologia Anexo, de Goiás, e pode ser expandido para toda a rede estadual até o fim do ano. De acordo com o edital disponível no site da empresa, o sistema realiza uma “leitura biopsicossocial” e oferece relatórios em tempo real.
Falta de respaldo legal
Apesar de estar em funcionamento, o programa não possui regulamentação. Um ex-funcionário da E.E. Deputado Augusto do Amaral, no bairro do Jaguaré (Zona Oeste de SP), relatou que a própria direção da escola admitiu não existir resolução pública ou contrato formal que autorizasse a coleta de dados.
Além dos alunos, professores também são avaliados. Em um caso citado, uma docente foi repreendida por apresentar índice de engajamento considerado “baixo” pelo algoritmo.
Especialistas alertam para ilegalidade
Para o professor Fernando Cássio, da Faculdade de Educação da USP, a prática pode configurar violação de direitos fundamentais. “Estão coletando dados biométricos de menores de idade sem contrato, sem consentimento dos pais e sem transparência. Isso é passível de ação judicial”, declarou.
O educador também ressalta que o projeto infringe o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garante a proteção integral dos direitos das crianças e adolescentes. Segundo ele, o fato de o SADI ainda estar em fase de testes torna a situação ainda mais preocupante:
“Essa inteligência artificial transforma o ambiente educacional em um laboratório para experimentos tecnológicos que usam crianças de escolas públicas como cobaias.”
Já o professor Daniel Cara, também da USP, afirma que a iniciativa é “arbitrária e coercitiva” e precisa ser efetivamente condenada. Ele lembra que sistemas de IA podem reproduzir preconceitos de seus países de origem, inclusive de caráter racial e social:
“Um sistema desenvolvido na Europa provavelmente vai identificar imigrantes como transgressores. É um sistema de vigilância anti-pedagógico, que não respeita a diversidade dos estudantes brasileiros.”
SEDUC-SP nega contrato
A Secretaria de Educação do Estado (SEDUC-SP) confirma que se trata de um “projeto piloto”, mas afirma que não há contrato firmado com o Instituto Anexo. Também não informou os nomes das outras escolas envolvidas no programa.
A reportagem entrou em contato com o Instituto Anexo e com a Diretoria de Ensino da Região Centro-Oeste (DECTO), mas não obteve resposta até a publicação desta matéria.
Enquanto isso, diretores de colégios confirmaram que as câmeras já estão instaladas e funcionando. O caso levanta sérias preocupações sobre privacidade, legalidade e impacto pedagógico da utilização de tecnologias de vigilância no ambiente escolar.
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