Direitos Humanos ou Barbárie: de que lado você está? – Por Maurício Saliba

Seria um texto absurdamente longo discutir toda a história dos direitos humanos, e sinceramente, duvido que você tenha paciência para isso. Então, vamos ao essencial: por que devemos defender os direitos humanos? Sempre digo aos meus alunos: se um dia você estiver viajando por um país qualquer e for confundido com um criminoso, torça para que nesse país existam direitos humanos. Porque são eles que garantirão que você tenha um julgamento justo e direito à ampla defesa. E, veja bem, é só isso que os direitos humanos preveem: tratamento digno para todos, porque somos todos humanos. Desumanizar um grupo é sempre o primeiro passo rumo à barbárie. E a barbárie é aquele lugar maravilhoso onde um grupo decide que o outro não é bem gente e, portanto, pode ser tratado como bicho.

Não raras vezes, encontramos pessoas que, sem um mínimo de reflexão, soltam pérolas como “direitos humanos para humanos direitos”. Ah, a sabedoria popular… Essa frase implica que direitos são privilégios concedidos apenas aos que se comportam dentro de um certo padrão moral ou legal, o que simplesmente destrói o conceito de universalidade dos direitos humanos. A expressão “humanos direitos” sugere que há os “não humanos”, ou seja, aqueles que podem ser eliminados sem peso na consciência. E quem costuma cair nessa categoria? Criminosos, presos, pobres, marginalizados. Uma visão muito conveniente para justificar tortura, pena de morte e outras maravilhas civilizatórias.
Aliás, essa não é uma ideia nova. Na história da humanidade, já desumanizamos todo tipo de gente: indígenas, negros, judeus, homossexuais, “bruxas”, comunistas, imigrantes… Sempre com aquele bom e velho argumento de que “os não humanos representam um perigo para nossa família, nossos costumes e nossa civilização”. A propósito, George Fitzhugh, um defensor ferrenho da escravidão nos EUA no século XIX, deixou registrada uma pérola de sua sapiência racista: “O negro é um escravo por natureza. Se fosse livre, tornar-se-ia um selvagem, um criminoso, um perigo para as famílias brancas. A escravidão o protege contra sua própria barbárie e contra o caos que sua liberdade traria”. Não sei você, mas eu já ouvi variações dessa ideia em pleno século XXI.
Se você fizer um esforço e olhar para a história, verá que negar a humanidade sempre foi a justificativa para escravidão, genocídio e outras práticas iluminadas. A famosa Controvérsia de Valladolid (1550) ilustra bem isso: quando os europeus “descobriram” os indígenas na América, surgiu um dilema teológico: seriam eles humanos? Caso fossem, deveriam ser tratados como irmãos; caso contrário, poderiam ser escravizados ou mortos sem remorso. Muito civilizado.
No fundo, a questão dos direitos humanos é uma disputa sobre quem consideramos humano de verdade. Quem tem direito à vida e quem só tem aparência de gente, mas, no fundo, é visto como um animal incômodo, uma praga a ser eliminada. Como bem observou Bernard Charlot, “por inversão de situação, o ‘civilizado’ trata aquele que considera bárbaro (não humano) com métodos cruéis – torturando, acendendo fogueiras, cortando cabeças, lançando bombas, reduzindo à escravidão etc. Aquele que nega a humanidade do outro também se coloca fora da humanidade: assim, a barbárie é contagiosa”.
E o mais interessante? Muitos grupos que hoje defendem os direitos humanos, no passado, também tiveram que lutar para serem reconhecidos como humanos. Mulheres, crianças, negros, homossexuais, judeus… Todos só conseguiram escapar da desumanização porque a definição de “ser humano” foi se expandindo ao longo da história. Mas, como Charlot alerta, essa definição é frágil e pode regredir.
Para esse mesmo autor, “o processo de civilização constituiu em universalizar a definição de ser humano e os direitos fundamentais que ela permite defender e, desse modo, fazer recuar a barbárie”. Mas, infelizmente, ela nunca desapareceu e hoje, “a questão da definição de ser humano está renascendo”. É isso que separa os fascistas dos democratas. Daqueles que insistem em redefinir quem é humano e quem pode ser descartado, projetando o retorno à barbárie.
Portanto, defender os direitos humanos é a única forma de evitar a barbárie iminente. Acredite, a história nos mostra que ela não está tão distante quanto gostaríamos de pensar. Enfrentar os fanáticos nacionalistas e racistas que tentam estabelecer uma hierarquia entre humanidade e desumanidade, celebrando a morte de pobres na periferia e perseguindo imigrantes considerados “sub-humanos”, é uma tarefa imperativa. A escolha é sua, apoiar os direitos humanos ou colaborar na difusão da barbárie. Lembre-se, a barbárie é contagiosa!

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Editor Ourinhos Online